Professor Kabengele Munanga da USP em entrevista

Durante muito tempo ausentes das prateleiras de bibliotecas e das salas de aula os livros que levantam questões sobre o negro brasileiro sem reduzi-lo a objecto começam a aparecer. Se antes a temática não representava um mercado potencial para as editoras, a nova legislação já dá mostras de avanços concretos.. Em vigor desde Janeiro de 2003, a nova lei federal torna obrigatório o ensino da História e Cultura Afro-Brasileira e Africana em todas as escolas de ensino. O livro Para entender o negro no Brasil de hoje: história, realidades, problemas e caminhos foi escrito pelo antropólogo Kabengele Munanga, da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas (FFLCH) da Universidade de São Paulo, e por Nilma Lino Gomes, da Faculdade de Educação da Universidade Federal de Minas Gerais. A obra está a ser usada nos cursos de graduação de outras universidades. Nesta entrevista, o professor Kabengele, que nasceu na República Democrática do Congo e lecciona na USP desde 1980, conversou sobre a educação no Brasil, defendeu o sistema de quotas e apresentou algumas ideias da sua obra.


“Política de quotas desencadearia ascensão económica dos negros”
Marana Borges
A aprovação da lei 10.639 ajuda a desconstruir o mito da democracia racial no Brasil?
A lei vem provar que o Brasil não era uma democracia racial, pois levou 115 anos para introduzir no ensino o estudo da matriz cultural africana. E ela não caiu do céu, mas é o resultado da luta do movimento social negro.. A nova lei tem tudo de positivo. Porém, é preciso que ela seja efectivamente implementada e que seja definido exactamente o conteúdo a ser ministrado. A África é um continente de 56 países e ilhas. A lei não disse que África e Brasil ensinar. Mas se não fosse a lei, ninguém se mobilizaria.


Como é o ensino da cultura afro-brasileira e africana na escola?

A África que nós conhecemos é a do Tarzan, Simba Safári, Sida, fome, guerras, das tribos. Será que a África é só isso? Já viu algum livro didáctico mostrar que a África é o berço da humanidade, que as maiores civilizações se desenvolveram lá, que a civilização egípcia era negra? Nunca se viu na historiografia oficial, nos livros didácticos, os impérios e reinos africanos. A África é simplesmente tida como tribo. É isso o que a lei pretende corrigir. Além de introduzir a história da África no currículo, é uma nova história que será ensinada, em que a identidade africana e dos afro-descendentes é apresentada de maneira positiva.


O senhor explica que foi após a conferência de Berlim (1885) que se deu a passagem de uma imagem positiva do povo e continente africanos para uma negativa.

Os primeiros viajantes em África, como os árabes, deixavam documentos sinceros sobre aquela sociedade, relatando as formas de organização política, expressão artística etc. Quando começou a colonização da África, essas memórias foram apagadas. Para se justificar a dominação através do discurso da Missão Civilizadora, foi preciso negar os atributos daquelas sociedades. Os livros escritos depois da colonização não trazem mais uma África autêntica, mas estereotipada. É essa África que foi ensinada na historiografia oficial. Isso também tenta justificar a posição do negro na sociedade brasileira. O discurso é também um dispositivo de dominação, é ele que legitima a situação do “outro”, o nomeia. Não basta força militar, é preciso que o poder seja legitimado pelo discurso.

O senhor vê resquícios dos princípios da Missão Civilizadora em alguns trabalhos assistencialistas de organiza­ções não-governamentais, que pretendem salvar o negro e pobre (já que no Brasil pobreza tem cor?
Seria uma injustiça dizer isso, pois não colaboro com ONG e conheço muito pouco sobre elas. Parto do princípio de que muitas delas perceberam que o Estado não estava a cumprir as suas obrigações. Nesse sentido, muitas organizações contribuíram com os países africanos, fazendo o que o governo não fazia no sistema de saúde e educação. Não
creio que eles estavam a fazer isso com o espírito da Missão Colonizadora. Como membros da sociedade e conscientes das injustiças cometidas contra essas sociedades, eles acham que podem fazer algo, não cruzam os braços.

Qual a importância da Frente Negra Brasileira e do Teatro Experimental do Negro para a educação e inclusão dos negros?
Foram tentativas. A Frente Negra Brasileira foi um movimento social fundado por uma elite negra dos anos 30. Ela foi a primeira a denunciar o mito da democracia racial, e só depois a academia foi estudá-lo.

Aqueles negros colocaram o mesmo problema que hoje estamos a colocar: a educação é um dos caminhos para poder integrar o negro no mercado de trabalho, no sistema de poder. A diferença é que os movimentos negros actuais, que surgiram em 1975, além de reivindicar a escola também querem que ela reconheça a sua identidade, ensine a história e cultura dos negros africanos. Movimentos negros anteriores, como no caso específico da Frente Negra, queriam simplesmente se integrar na cultura dominante. Porém, ambos os movimentos lutam para que o negro faça parte do sistema educacional.

Quantos negros há na Universidade de São Paulo? Como surgiu o debate sobre quotas?
Chegou um momento em que os movimentos sociais negros descobriram que o único caminho para garantir o acesso do negro à educação superior de boa qualidade, era através de uma política pública, uma medida obrigatória. E se isso não for feito, se contar apenas com a boa vontade do cidadão, nada vai acontecer. É claro que o sistema de cotas
é uma experiência que já foi vivida por outros países do mundo. É o caso, por exemplo, dos EUA, onde os negros são cerca de 12% da população e, a partir das lutas pelos direitos cívicos nos anos 60, uma parcela deles conquistou uma grande mobilidade social e económica. Há uma classe média negra bastante notável, com intelectuais nas grandes
universidades, médicos em grandes hospitais, engenheiros até na NASA. A experiência deles deu certo. Na Índia o governo também adoptou a política das cotas para as castas dos “intocáveis” desde 1950, três anos após a independência do país. Essa política já existe em outros países. Porque é que no Brasil ela tem um tom de novidade, como se não houvesse outras experiências noutros lugares? Justamente porque não há vontade política para mudar as coisas. Quantas coisas o Brasil copia dos Estados Unidos? Modelo económico, ciência e tecnologia.. . Não copiam as cotas porque não querem. Muitos brasileiros ainda não acreditam na existência do racismo no Brasil. Eles acham que a questão é simplesmente económica, de classes, ou uma questão social. Como se o machismo e a homofobia não fossem uma questão social. Todas as questões que tocam a vida do colectivo são sociais, mas o social não é algo abstracto, tem especificidade, tem endereço, sexo, religião, cor, idade, classe social.
Muitos acham que o caminho para corrigir as desigualdades sociais seria uma política universalista, baseada na melhoria da escola pública, o que tornaria todos os cidadãos brasileiros capazes de competir. Mas isso é um discurso para manter o status quo, porque enquanto se diz isso nada é feito. Não se esqueça que quando as escolas públicas no Brasil eram boas, os negros e pobres não tiveram acesso a ela. Havia uniformes caros e outros mecanismos que os ­excluíam. O pobre estudava nas escolas particulares, como foi o caso de José Corrêa Leite, um dos fundadores da Frente Negra Brasileira. Então não adianta dizer que basta melhorar o nível das escolas públicas. Mesmo porque isso significaria acabar com a clientela das escolas particulares, que possuem um forte lobby e não tem nenhum interesse em ver escolas públicas de boa qualidade. Se o governo conseguisse fazer isso, entenda-se melhorar a escola pública, seria óptimo. Mas a partir do momento em que os pobres e os ricos mandarem seus filhos para as escolas públicas, haverá outras formas de excluir o negro. O problema de cotas será colocado novamente.

Então haveria um círculo vicioso?
Sim, mas há uma saída. Um aluno que entra pelas cotas e se forma, vai encontrar as mesmas barreiras do preconceito no mercado de trabalho. Mas a situação dele será diferente, pois ele terá sólida formação, que vai lhe abrir muitas portas. Ele certamente passará num concurso público. E quando ele encontrar alguma porta fechada, saberá lutar
pelos seus direitos, ou poderá ter emprego e dinheiro para contratar um advogado. É uma grande diferença. É como dizer que a sociedade deixou de ser machista. Não é verdade. A mulher está a ocupar os espaços públicos porque ela lutou e se capacitou. A competência abre muitas portas, embora muitas outras estejam fechadas. Como essa mulher também não tinha uma formação política, achava que seu lugar era na cozinha e
na maternidade.

O senhor se refere às mulheres brancas?
Sim, pois as mulheres negras são as maiores vítimas da discriminação. São duplamente discriminadas, enquanto mulheres e enquanto negras. Mas o acesso à educação propicia melhor consciencialização e capacidade de lutar pelos seus direitos. Além do mais, a educação tem um factor de multiplicação. Um jovem que foi para a escola, passou por uma boa universidade, tem consciência dos problemas da sociedade, não deixará seus filhos passarem pelo mesmo caminho. O acesso que ele tem a uma certa mobilidade social e ascensão económica faz com que seus filhos possam estudar numa boa escola. E ele pode também se tornar aquele referencial que o negro não tem.

O “programa universidade para todos” teria os mesmos resultados que as cotas nas universidades púbicas, no sentido de propiciar a consciencialização política e ascensão económica de pobres e negros?
Creio que sim. Não sei como as escolas particulares trabalham as questões raciais, mas o aluno que entra pelo “programa universidade para todos” informa-se sobre o programa e sabe porque está a ir na universidade. Há faculdades particulares de qualidade. E todas têm o efeito multiplicador, tanto na educação dos filhos como na futura ascensão económica deles. A expansão do ensino público leva tempo. Enquanto isso os jovens que terminaram o Ensino Médio não podem estudar? Graças ao “programa universidade para todos” hoje há mais de 40 mil afro-descendentes que entraram nessas escolas particulares. Isso é um ganho.

No seu livro, como em outras obras, o senhor desconstrói o mito de um sistema esclavagista africano que justificaria e legitimaria as formas de escravidão que deram origem aos tráficos. Qual era o conceito de “escravo” em África antes dos tráficos liderados por europeus e árabes?
Em primeiro lugar, a existência do chamado “escravo” não é razão para aceitar a escravidão. Em qualquer circunstância, a escravidão é uma instituição desumanizante e deve ser condenada. O homem nasce livre até que alguém o escravize. Portanto, o próprio conceito está errado. O correcto é “escravizado”, não “escravo”. Não há uma categoria de escravo natural. Porém, esse conceito já está enraizado na literatura. Em segundo lugar, o conceito de “escravo” vem de outra visão do mundo, diferente da africana. Como nas outras sociedades, em África existia a categoria de cativos, que eram prisioneiros de guerra ou pessoas que cometiam algum delito na sociedade e eram levadas por outros grupos étnicos. Os homens trabalhavam como serventes dos reis, príncipes e guerreiros, enquanto as mulheres se tornavam esposas e reprodutoras das famílias reais. Todos os filhos dos cativos eram livres. Nos outros casos, famílias penhoravam algum parente quando havia grandes calamidades. Esses parentes poderiam trabalhar nas outras famílias temporariamente ou para sempre, caso a família original não tivesse condições de adquiri-lo de volta. Em hipótese alguma havia um escravismo como sistema de produção, pois não era uma sociedade de acumulação de capital, mas de subsistência. Essa categoria de cativo africano foi traduzida como escravo. Mas não o é, pois o sistema escravista pressupõe que os escravizados sejam bem mais numerosos que os senhores. No Brasil, até século XVII, os negros eram cerca de 70% da população. Em compensação, algumas sociedades africanas não queriam nem guardar o cativo, achavam que ele não servia para nada. Por isso alguns eram enterrados vivos com reis, para servi-lo no outro mundo. Muitos reis e príncipes colaboraram com o tráfico negreiro para outros continentes, capturando negros de outros grupos étnicos para vendê-los como escravizados. Mas este facto também não justifica a escravidão. Quando se fala de escravidão na África só se pensa no tráfico liderado pelos europeus.

E a responsabilidade árabe com a escravidão através das rotas oriental e transaariana?
Não se fala sobre isso porque a escravidão liderada pelos árabes é anterior à europeia. Começou no século VI e terminou no século XX. Os escravizados foram deportados para os países do Oriente Médio. Talvez não se fale muito porque não se vê tantos negros mestiços nos países árabes como se vê nas Américas. Isso porque era frequente a castração dos negros, muitos trabalhavam como eunucos. Apesar de as mulheres servirem como concubinas nos haréns, a taxa de mortalidade dos negros era alta. Inclusive quando as pessoas dizem que o Brasil foi o último país do mundo a abolir a escravidão, não é verdade. A Arábia Saudita a aboliu em 1962. É uma história que ninguém conhece.

Perfil
Kabengele Munanga nasceu na República Democrática do Congo, antigo Zaire, no dia 19 de Novembro de 1942. Foi o primeiro antropólogo do seu país, tendo saído pela primeira vez para fazer mestrado na Bélgica. Chegou ao Brasil por convite de um colega, terminado o seu doutorado, retornou ao Congo. Em 1980 veio para o Brasil, para assumir a cadeira de Antropologia na Universidade do Rio Grande do Norte. Depois de um ano muda-se definitivamente para São Paulo, tomando como sua casa a Universidade de São Paulo. Tem cinco filhos, dois belgas, dois do congo e um brasileiro.
“ O meu nome, pronunciado na minha língua materna, é Kabengele Munanga. Eu nasci em Bakwa Kalonji, no antigo Zaire, actualmente República Democrática do Congo, no dia 19 de novembro de 1942. O nome do meu pai é Ilunga Kalama. O nascimento dele eu não sei, porque quando meu pai faleceu, eu era criança de 6 meses. Naquela época, em plena colonização, não havia cartório, então não tenho registo. Minha mãe é Mwanza Wa Biaya, nascida na cidade Bakua Mulumba, no antigo Zaire, não conheço a data dela de nascimento, mas meu irmão disse que ela teria falecido com uma idade estimada de 100 anos”.
Vida Cultural/JA
Atenção:
A prática, indução ou incitação de discriminação ou preconceito de raça, cor, etnia, religião ou procedência nacional, por meio da Internet, constitui crime punido com reclusão de 2 (dois) a 5 (cinco) anos e multa, conforme determina a Lei 7.716/89 em seu artigo 20, § 2°. Denuncie aqui sites e/ou mensagens de fóruns hospedados na Insite contendo qualquer violação.
Brasil Vivo
Vivo Africa

Fonte: Rede 3Setor

II Caminhada Contra Intolerância Religiosa e pela Paz em Itapuã

O Terreiro Abassá de Ogum

Convida todos/as para a II Caminhada Contra Intolerância Religiosa e Pela Paz em Itapuã.

panfletoda2caminhada Onde?: Do largo da Sereia até a Lagoa do Abaeté

Quando?: 21 de Janeiro de 2009

Horas: A partir das 9:00hs.

Contatos:

Danielle Felicio: (71) 8603- 5632

Rebeca Tárique: (71) 8742- 5727

Rebeca Tárique:

Diretora Nacional de Juventude do Coletivo de Entidades Negras/BA- : http://cenbrasil. blogspot. com
Rede Latino Americana e Caribenha de Jovens pelos Direitos Sexuais e Reprodutivos REDLAC-Brasil

Contato:55.71 8742-5727/ 8107-3329

msn: rtsm_9@hotmail. com, kizom@hotmail. com

Estudantes cotistas valorizam mais a vaga na universidade, revela estudo

20/12/2008
Os estudantes que entraram na universidade por meio do sistema de cotas para negros tendem a valorizar mais a sua vaga do que aqueles que não são cotistas, especialmente nos cursos considerados de baixo prestígio. Essa é uma das conclusões do estudo Efeitos da Política de Cotas na UnB: uma Análise do Rendimento e da Evasão, coordenado pela pedagoga Claudete Batista Cardoso, pesquisadora da Universidade de Brasília (UnB).
De acordo com a pedagoga, os cotistas negros obtiveram notas melhores do que os demais alunos em 27 cursos da UnB. No curso de música, por exemplo, as notas dos cotistas são 19% superiores às dos demais estudantes. Eles também se destacam em cursos como matemática, em que a diferença é de 15%, artes cênicas (14%), artes plásticas (14%), ciências da computação (13%) e física/licenciatura (12%).
De acordo com Claudete Cardoso, uma das explicações para o melhor desempenho é que os cotistas valorizam mais o fato de passar no vestibular e entrar na universidade, o que para eles pode representar uma possibilidade de mobilidade social.
“Até porque [geralmente] eles não conseguem entrar na universidade, então vêm as cotas, eles têm uma chance maior e tem sido atribuído esse melhor desempenho deles a um maior esforço para preservar a vaga, para chegar ao fim do curso”, disse a pesquisadora, em entrevista à Agência Brasil.
O estudo também mostrou que, em geral, os alunos cotistas têm desempenho melhor nos cursos da área de humanidades, rendimento semelhante ao dos demais na área de saúde e notas inferiores em alguns cursos de exatas, particularmente as engenharias. Isso porque são cursos que requerem uma base melhor do ensino médio, segundo Claudete.
“O aluno já entrou sabendo que uma das dificuldades é a barreira do vestibular, por isso a instituição das cotas. Na universidade ele precisa dessa base, é uma base que ele necessariamente vai ter que ter, então a dificuldade que ele encontra no vestibular se repete na universidade, por isso a diferença entre eles é bem maior e o cotista vai pior do que o não-cotista”, explicou.
Isso justifica as notas menores em cursos como engenharia civil (41% inferior às dos não-cotistas), engenharia mecatrônica (-32%) e engenharia elétrica (-12%).
Por outro lado, o caso do curso de matemática – no qual, apesar de ser da área das ciências exatas, os cotistas têm notas melhores – se justifica por ser um curso pouco prestigiado, não só na universidade, mas também socialmente e em termos de remuneração para o profissional.
De acordo com Claudete, em geral, os alunos acabam desistindo da carreira, já que o curso demanda um esforço relativamente grande, mas nem sempre dá o retorno profissional desejado. Para os cotistas, a visão é diferente. “Eles dão muito valor ao curso, mesmo que seja um curso de baixo prestígio social.”
Fonte: Agência Brasil

SEMINÁRIO ESTADUAL DO CONGRESSO DE NEGRAS E NEGROS DO BRASIL

ESTADO DO RIO DE JANEIRO

CONVOCAÇÃO

Convocamos a todas as pessoas , militantes, grupos, entidades e instituições interessadas em participar do Seminário Estadual do CONNEB no Estado do Rio de Janeiro, para debater assuntos referentes a População Negra do Brasil.
Data : 13/12/2008
Local: SINTERGIA
Endereço: R. Marechal Floriano,199 - 7º andar - CENTRO - Rio de janeiro - RJ
Rua do Palácio Itamaraty - LIGHT - próxima a CENTRAL DO BRASIL
De Metrô saltar na Estação PRESIDENTE VARGAS -
Horário : 09:00h ( credenciamento ) às 17:00h
.
Critério de participação: enviar e-mail de inscrição com a ficha anexa preenchida para connebrjsecretariaoperativa@yahoo.com.br e pagar a inscrição - R$ 3.00 ( três reais ) no ato do credenciamento.
RUMO AO CONGRESSO NACIOAL DE NEGRAS E NEGROS !
Esta etapa busca construir o debate sobre temas para contribuir com a Assembléia do Pará (29, 30 e 31/01/09)


MNU / UNEGRO / CEAP / ASPECAB / COLYMAR / CAD / CENIERJ / MMKING/ CETRAB / MOVIMENTO DE CONSCIENTIZAÇÃO NEGRA DE VOLTA REDONDA / CABEÇA DE NEGRA / UNAT/ HUMANITAS /PÉROLA NEGRA / FÓRUM ESTADUAL DE MULHERES NEGRAS RJ / IPDH/SIDSPREV


COORDENAÇÃO EXECUTIVA DA ASSEMBLÉIA

Secretaria Operativa CONNEB - Rio de Janeiro

Construir um "Projeto Político do Povo Negro para o Brasil"

Visitem www.conneb.org.br

Fonte: Congresso Nacioanl de Negr@s

Prefeito recebe representantes do movimento negro‏

03/12/08 18:24

Representantes da Fundação Afonso Arinos, uma das entidades que representam a comunidade negra em Maceió, solicitaram nesta quarta-feira (3), ao prefeito Cícero Almeida, o ensino de capoeira nas escolas municipais e a inclusão no calendário turístico da cidade do dia 2 de fevereiro como homenagem à Tia Marcolina, sacerdotisa das religiões africanas e mártir da destruição de terreiros de candomblé de Maceió, ocorrido em 1912, fato que ficou conhecido como "Quebra".

As duas propostas serão estudadas pela Prefeitura. No caso da capoeira, já existe um projeto da Secretaria Municipal de Educação (Semed). A homenagem à Tia Marcolina dependerá da aprovação de projeto de lei a ser encaminhado à Câmara Municipal.

O presidente da fundação, Edson Moreira, agradeceu a Almeida a iniciativa de tornar feriado o dia 20 de novembro, Dia da Consciência Negra, em homenagem a Zumbi dos Palmares. Uma cópia ampliada da lei foi assinada nesta quarta (3), pelo prefeito e colocada numa moldura que será instalada na sede da fundação.

"O prefeito Cícero Almeida deu exemplo para o Brasil", afirmou Moreira. Almeida lamentou o fato de que o feriado deste ano não foi seguido por todos os setores da sociedade. "Vamos nos programar para comemorar nos próximos anos o dia 20 de novembro com grande festa, unindo todos os grupos", ressaltou.

A Fundação Afonso Arinos entregou ao prefeito um quadro de Zumbi dos Palmares, pintado pelo artista plástico José Zumba. A pintura foi colocada em local de destaque no gabinete do prefeito. Outro quadro presenteado pela entidade a Almeida foi o de Tia Marcolina. Também estava presente à reunião o secretário-geral da Fundação Afonso Arinos, Pedro Paulo Barbosa.

por Secom Maceió

Fonte: Alagoas em Tempo Real

Professora da rede pública do DF ganha prêmio ao ensinar a cultura afro

(03/12/2008 - 09:55)

A professora Nádia Maria Rodrigues, 40 anos, tinha o hábito de alisar os cabelos negros desde criança. Nesse período, não percebia que os termos ovelha e lista negra diziam respeito à raça e à cor de sua pele. Nem imaginava o quanto existia de preconceito e como era deficiente o ensino da cultura afro nas escolas. Nádia trabalha como professora há 22 anos. Começou a estudar a cultura dos antepassados há pouco mais de um ano. O resultado já deu frutos. Ela recebe hoje, do Ministério da Educação (MEC), o Prêmio Professores do Brasil, dedicado aos educadores que trabalharam temas importantes da cultura brasileira com criatividade e tiveram resultados interessantes com os alunos. É a única professora do Distrito Federal a receber a premiação.
"Nós, negros, não temos uma representação positiva. E isso passa para as crianças. Percebi isso e senti a necessidade de trabalhar a cultura afro na escola", afirma a professora, que dá aulas para crianças da 3ª série do ensino básico, com idade média de 8 anos. Ela abordou cinco temas diferentes: identidade negra; formação do povo brasileiro; falta de personagens negros na cultura, como heróis, fadas, anjos etc.; expressões preconceituosas utilizadas no cotidiano e a história da relação de poder entre negros e brancos. Para isso, usou livros, atlas, máscaras típicas e música.
O resultado com os alunos surpreendeu a professora. Ela recebeu relatos dos pais dizendo que estavam aprendendo muito com os filhos. As crianças a procuravam para contar como tinham negros nos shows que haviam ido. E, o que a deixou mais contente, foi perceber que muitos estudantes negros, que no início tinham vergonha de assumir a identidade afro, chegaram ao fim do ano orgulhosos da cor da própria pele. De quebra, aprenderam a criar máscaras africanas, que a professora orgulhosamente expôs no local onde os projetos premiados pelo MEC estavam sendo apresentados.
O trabalho de valorização da cultura negra é obrigatório na educação brasileira desde 2003, quando foi publicada a Lei nº 10.639. Mas o que o decreto não previu era que, antes, seria necessária uma preparação dos professores para tratar o tema. "Muitas vezes os próprios professores incorporam o preconceito e não sabem como agir. Ações como as da professora Nádia não deveriam ser isoladas, e sim uma regra na educação", afirma a professora da UnB Glória Moura, doutora em educação pela Universidade de São Paulo (USP) e especialista em relações étnico- raciais.
De acordo com Glória, atividades que trabalhem o tema da identidade cultura negra são muito importantes. "Muito do preconceito nasce do desconhecimento, e esses alunos desconheciam a cultura afro, o que podia gerar preconceito", diz. Segundo ela, não há como pensar o povo brasileiro sem levar em conta a cultura africana na formação da nossa identidade nacional. Mas ela lembra que ainda falta muito a avançar. "O negro sempre está numa relação pior. Não há igualdade de oportunidades. O país ainda não aceita a miscigenação."
Após se envolver com o projeto, a professora Nádia assumiu o cabelo crespo. Percebeu também que existia muito mais preconceito do que imaginava. Sentiu, como nunca, a necessidade de mostrar aos outros professores a importância do estudo da cultura afro. "Em nenhuma das escolas em que trabalhei a cultura negra era trabalhada no currículo escolar", lembra. Agora, com o prêmio de R$ 5 mil, pretende viajar e conhecer mais o universo com que trabalha. "Quero ir para Angola e aprender mais sobre a África."
Na apresentação que fez aos outros 30 professores premiados, ela finaliza com um poema de Maria Helena Vargas da Silveira: "As pedras que nos machucam vêm por trás, são atiradas/ Por favor educador!/ Conscientiza teus alunos,/ Que as pedras machucam,/ Não importa a direção./ E não ignore a pedrada,/ Por que ela existe,/ Por que persiste./E precisa,/E necessita,/ Ser trabalhada".

Divulgação

Fonte: Fundação Cultural Palmares

Saiu na imprensa

O Dia

02/12/2008 01:47:00
Processo contra intolerância

Comissão entra com ação contra duas emissoras de TV alegando discriminação religiosa

Carol Medeiros

Rio - A Comissão de Combate à Intolerância Religiosa está processando a Rede TV! e a MTV por incluírem em suas programações cenas de conteúdo discriminatório contra o candomblé e a umbanda. A organização, que reúne entidades de diversas religiões, entrou com ação na Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão contra os programas de humor 'Pânico na TV' e 'Hermes e Renato', que exibiram quadros que fazem piada com cerimônias das duas religiões.

No 'Pânico na TV', o personagem Christian Pior satiriza práticas da umbanda, criando o "despacho de luxo". Em 'Hermes e Renato', no quadro 'Macumba', os humoristas reproduzem um ritual da religião. Segundo a petição enviada pela comissão à procuradora Gilda Pereira Carvalho, eles foram "considerados impregnados de ofensas às religiões afro-brasileiras, diante do uso freqüente de palavras e imagens simbólicas, tais como: encosto, exus, caboclos, pomba-gira, macumba".

A denúncia de discriminação religiosa foi feita primeiro ao Ministério Público (MP) de São Paulo, que pediu o arquivamento do processo. Em sua decisão, o MP aceitou a justificativa da Rede TV!. A emissora negou que tenha usado "imagens discriminatórias ou de intolerância" e alegou direito à "liberdade de expressão artística e intelectual". Para o secretário da comissão, Jorge Mattoso, não se pode privilegiar à liberdade de expressão em detrimento de valores como igualdade e dignidade humana.

"Eles fazem uma caricatura dessas religiões. As encenações, para seus adeptos, são ofensivas e estimulam a discriminação de seus praticantes", explica o advogado Luiz Fernando Martins, assessor jurídico da comissão. A Rede TV! e a MTV não quiseram se pronunciar antes da decisão da Procuradoria.

Jornal O Dia

Programa de Reflexões e Debates para a Consciência Negra realiza palestra

O PROGRAMA DE REFLEXÕES E DEBATES PARA A CONSCIÊNCIA NEGRA estará realizando, no próximo dia 27 de novembro, às 19 horas a palestra "EMPREENDEDORISMO: novos caminhos de luta para a liberdade e realização"

A programação mensal do PROGRAMA DE REFLEXÕES E DEBATES PARA A CONSCIÊNCIA NEGRA vem homenageando as lutas pela liberdade e emancipação.

No mês de abril para debater e refletir sobre a Abolição da Escravatura e as condições presentes na sociedade brasileira, promovemos a palestra "ESCRAVATURAS e NOVAS ABOLIÇÕES EM PROCESSO".

Agora em novembro, mês de comemoração do Dia Nacional da Consciência Negra, em memória de Zumbi dos Palmares como símbolo de resistência à escravidão, realizaremos a palestra "EMPREENDEDORISMO: novos caminhos de luta para a liberdade e realização", com empreendedoras relatando e conversando sobre suas experiências empresariais.

palestrantes:
Cássia Marinho
Sônia Bahiana
Mara Silva

coordenação:
Profa. Carla Lopes

data e hora:
27/Novembro às 19 h

local:
Colégio Estadual Professor Sousa da Silveira

endereço:
R. Amália s/n - Quintino Bocaiúva
Rio de Janeiro - RJ

contatos:
programa.rdcn@gmail.com
(21) 2595-6209 / 5691

Reportagem analisa os cinco anos de implementação da lei 10.639/03 e a recente vigência da lei 11.645/08

MAIS QUE A ABOLIÇÃO, ALÉM DA OCA

Renata Celani*

Cinco anos após a promulgação da lei 10.639/03, que altera a LDB e institui a obrigatoriedade do ensino de história e cultura africana e afro-brasileira na educação básica, sua tímida implementação em nível nacional é marcada pela descontinuidade das políticas públicas; recentemente sancionada, a lei 11.645/08, que ratifica a 10.639/03 e torna obrigatório o ensino da história e cultura dos povos indígenas brasileiros, aguarda ser regulamentada e gera expectativas sobre sua adoção de fato.

Na Escola Creche Vovô Zezinho, de Salvador (BA), crianças de três anos ouvem contos africanos e, a partir deles, realizam atividades como o plantio de sementes e o estudo do corpo humano; os pais de alunos da Escola Municipal de Ensino Fundamental José Pereira de Borba, em Itapecirica da Serra (SP), foram chamados para debater, junto com os professores, a incorporação da temática racial no projeto político-pedagógico da escola; na Universidade do Estado de Santa Catarina (UDESC), seu Núcleo de Estudos Afro-Brasileiros promove atividades de ensino, pesquisa e extensão relacionadas a este campo do conhecimento.

Em instituições de ensino de todo o Brasil vem crescendo o número de iniciativas com o objetivo específico de atender uma alteração da LDB determinada pela lei 10.639, de 9 de janeiro de 2003, que tornou obrigatório, na educação básica, o ensino de história e cultura africana e afro-brasileira e a educação para as relações étnico-raciais. Esta lei foi ratificada por outra, a 11.645, de 10 de março de 2008, que acrescentou a história e cultura indígena ao texto original da 10.639/03.

Na perspectiva nacional, porém, essas iniciativas acontecem de forma isolada e geralmente concretizam-se em função de um professor que assume a tarefa de abrir espaço para estes conteúdos em suas aulas. Cinco anos após a promulgação da lei 10.639/03, sua implementação vem seguindo o compasso descontínuo das políticas públicas pontuais - os exemplos citados no início desta ainda configuram-se como exceções no cenário educacional.

Segundo os entrevistados desta reportagem, ainda há muito por fazer para que a LDB seja realmente cumprida por todas as etapas de ensino no que tange à lei 10.639/03, e particularmente nas 203,9 mil escolas de educação básica brasileiras (Censo Escolar 2006, INEP). As ações em curso, porém, estão aumentando não apenas quantitativa, mas qualitativamente - e esse movimento começa a abrir caminhos, inclusive, para facilitar a adoção da lei 11.645/08.

Valorização da diversidade cultural

As leis 10.639/03 e 11.645/08 inscrevem-se no Artigo 26 da LDB, onde já constava, antes da promulgação destas, a necessidade se considerar, no ensino de História do Brasil, "as contribuições das diferentes culturas e etnias para a formação do povo brasileiro, especialmente das matrizes indígena, africana e européia". A alteração na LDB promovida pelas duas leis reforça e amplia este preceito, apontando os temas que devem constar no conteúdo programático das escolas especificamente com relação à história e cultura africana, afro-brasileira e dos povos indígenas, determinando a inserção destes temas em todo o currículo escolar, em diferentes disciplinas, e instituindo o Dia da Consciência Negra (20 de novembro) no calendário escolar.

A Resolução do Conselho Nacional de Educação n° 1, de 17 de junho de 2004, tratando do parecer sobre as Diretrizes Curriculares para a Educação das Relações Étnico-Raciais e Para o Ensino de História e Cultura Africana e Afro-Brasileira, regulamentou a lei 10.639/03. O documento incorpora a educação para as relações étnico-raciais como tema obrigatório no escopo da lei e indica ainda a necessidade de incluir estes conteúdos nas etapas de educação infantil e no ensino superior, além do ensino fundamental e médio, a fim de que a lei seja adequadamente cumprida. A lei 11.645/08 aguarda regulamentação semelhante.

A conjuntura dos últimos anos favoreceu a aprovação destas leis: de forma quase que inédita, pautas envolvendo a condição sócio-cultural e econômica atual de negros e dos povos indígenas começaram a ganhar espaço no âmbito do governo federal; no panorama internacional, está em curso uma ampla discussão sobre a importância de se valorizar a diversidade cultural e combater todas as formas de racismo, discriminação e intolerância, o que envolve tratados internacionais em que o Brasil é signatário.

"O preconceito racial não é um problema dos negros, é um problema do Brasil. É um problema que deve ser combatido por todos os brasileiros", afirma André Lázaro, Secretário de Educação Continuada, Alfabetização e Diversidade (SECAD) do MEC. "Um ambiente escolar sem preconceito certamente contribui para aprimorar o desempenho dos alunos. E uma criança aprende melhor lendo coisas que sejam interessantes para ela; se eu consigo que alunos negros leiam sobre História da África, estarei contribuindo para o aprendizado da leitura".

Lei 10.639/03: ações do governo e da sociedade civil

A lei 10.639/03 também é fruto direto de reivindicações históricas do movimento negro e está amparada numa realidade marcada pela desigualdade, inclusive no campo educacional: de acordo com o IBGE (Censo 2000), entre os estudantes de ensino médio, a quantidade de brancos (52%) é quase o dobro da de negros e pardos (28,2%), e no ensino superior os brancos estão cerca de quatro vezes mais presentes que os negros. A diferença de escolaridade média entre negros (6,1 anos) e brancos (8,4 anos) na faixa dos 25 anos mantém-se a mesma (2,3 anos) há três gerações. "Um fato que se repete há três gerações não pode ser explicado senão por um problema estrutural da sociedade brasileira", observa André Lázaro. Noventa milhões de descendentes de africanos povoam o país 120 anos após abolição, representando 49% da população brasileira, segundo dados do IPEA.

A vigência desta lei desencadeou ações, em todo o Brasil, tanto do poder público quanto da sociedade civil, com o objetivo de implementá-la. No âmbito federal o MEC, através da SECAD, organizou, de 2004 a 2006, fóruns de discussão, cursos, lançou e apoiou publicações didático-pedagógicas e estimulou a criação de Núcleos de Estudos Afro-Brasileiros (NEABs) nas instituições de ensino superior.

Em 2008 a Secretaria retomou uma mobilização mais intensa e, entre outras ações, promoveu os Diálogos Regionais, ciclo de encontros que desde o início do ano vem reunindo escolas, sindicatos, diretorias de ensino e organizações da sociedade civil de todas as regiões do país para discutir avanços e problemas locais referentes à aplicação da lei 10.639/03. Os resultados destes encontros irão subsidiar um plano de metas estabelecendo ações de curto, médio e longo prazos para a implementação efetiva da lei, em todo o Brasil, até 2015. O documento-base deste plano está sendo desenvolvido por um grupo de trabalho composto por representantes do governo e da sociedade civil.

Entre os estados, antes da promulgação desta lei as constituições da Bahia, Rio de Janeiro e Alagoas já apontavam para a necessidade de incorporar conteúdos referentes a ela em suas redes escolares. Depois da promulgação, Sergipe decretou sua lei estadual; no Mato Grosso do Sul, o Conselho de Educação local emitiu parecer sobre o tema. São Paulo não regulamentou a lei localmente e ofereceu aos professores da rede estadual um curso de formação.
Alguns municípios, como São Carlos e Campinas (SP), Salvador (BA), Belo Horizonte (MG), Porto Alegre (RS), Criciúma (SC) e Teresina (PI), também já tinham incluído o tema em leis próprias, e realizado ações referentes a ele, antes da vigência da 10.639/03. Depois dela, o Conselho Municipal de Educação de Salvador a regulamentou localmente; em cidades como Santos (SP), Vitória (ES) e Cabo Frio (RJ), houve a organização de palestras, cursos, a distribuição de material didático-pedagógico e a criação de núcleos de estudos. Tanto nos estados, quanto nos municípios brasileiros, as ações pela implementação, e sua freqüência, variaram da adesão mais sistemática a ações esporádicas ou inexistentes.

Com a promulgação da lei 10.639/03, algumas organizações da sociedade civil passaram a atuar fortemente no apoio à sua implementação, ou a dar continuidade a ações educacionais que já existiam antes dela dentro de segmentos do movimento negro, em parceria com o poder público ou com o apoio de organismos internacionais e empresas privadas. Um aspecto a ressaltar é que organizações não originárias do movimento negro também passaram a trabalhar pela implementação da lei.

Houve a realização de cursos de capacitação, palestras e debates, o lançamento de publicações, a organização de consultas e pesquisas e a realização de concursos. Nestas duas últimas atividades destacam-se ações realizadas por duas organizações sediadas na cidade de São Paulo: o Centro de Estudos das Relações de Trabalho e Desigualdade (CEERT), que cria e executa diversos projetos voltados para a promoção da igualdade de raça e gênero, e a Ação Educativa, que promove o direito à educação e da juventude, o que inclui proposições de mudanças nas políticas públicas. As duas organizações integram o GT do SECAD/MEC responsável pela elaboração do plano nacional de metas para a implementação da lei 10.639/03.
O Prêmio "Educar para a Igualdade Racial - Experiências de Promoção da Igualdade Racial-étnica no Ambiente Escolar", realizado pelo CEERT desde 2002, tornou-se uma referência nacional a respeito de como e onde estão sendo ocorrendo ações referenciadas na lei. As experiências apresentam uma grande diversidade de propostas e ações.

"Neste ano, por ocasião da quarta edição do prêmio, mudamos um pouco o formato e criamos a categoria escola", explica Billy Malachias, responsável pelo programa de educação do CEERT, "porque percebemos que precisávamos incentivar a implementação da lei dentro da gestão escolar, já que muitos professores inscritos na terceira edição afirmaram trabalhar sozinhos com o tema".

A Ação Educativa coordenou a consulta "Igualdade das Relações Étnico-Raciais na Escola - possibilidades e desafios para a implementação da Lei n° 10.639/2003", uma iniciativa da organização em parceria com o CEERT e com o Centro de Estudos Afro-Orientais (CEAFRO) da Universidade Federal da Bahia (UFBA). A consulta objetivou ouvir a comunidade escolar, especialmente pais, alunos e funcionários, sobre suas percepções e propostas a respeito da educação para as relações étnico-raciais e o ensino da história e cultura africana e afro-brasileira nas escolas, a fim de subsidiar idéias para o aprimoramento de políticas públicas. Foram selecionadas 15 escolas de São Paulo, Salvador e Belo Horizonte, municípios que adotaram iniciativas de implementação da lei em suas respectivas redes de ensino.

"Dois resultados que nos surpreenderam", diz Tania Portella, assessora da Ação Educativa e responsável pela coordenação das equipes de campo da consulta em Salvador e São Paulo, "foram com relação aos pais e alunos. Com relação aos alunos, uma grata surpresa: o repertório deles de curiosidade quanto ao que aprender sobre cultura africana e afro-brasileira é amplo", afirma Tania. "Outra questão é que a percepção que eles têm sobre os conflitos raciais na escola nem sempre chega aos pais. Há o silêncio. É preciso estar muito atento a isso. O racismo provoca um tipo de sofrimento para estes meninos e meninas a tal ponto que eles não verbalizam, não o expõem para as suas famílias".

Ainda no campo das ONGs, outra ação em curso atualmente, liderada pelo Instituto da Advocacia Racial e Ambiental (IARA), sediado na cidade do Rio de Janeiro, é a representação encaminhada Ministério Público Federal em 2005 para verificar o cumprimento da lei 10.639/03. Segundo o advogado Humberto Adami, presidente do IARA, "em cada município do país abre-se um inquérito civil público, oriundo de uma mesma petição, e intimam-se todas as diretoras de escolas de ensino médio e fundamental, da escola pública e privada, para que respondam o que estão fazendo da lei 10.639. Estamos sendo intimados nesses inquéritos e temos nos pronunciado, respondendo e recorrendo de eventuais arquivamentos".
Apesar de não haver sanção prevista para o descumprimento desta lei, Humberto informa que o IARA está "indicando a possibilidade de imputação de crime de responsabilidade, tendo em que a própria LDB prevê a responsabilização da autoridade competente que não oferece em sua completude os conteúdos referentes ao ensino obrigatório".

Implementação avança, mas lentamente

O resultado deste conjunto de ações fez com que acontecessem mudanças. "Havia um represamento, uma invisibilidade dessa temática. Alguns dos educadores que estão em sala de aula, ao entrar em contato com ela, se apaixonaram e incorporaram definitivamente estes conteúdos", afirma o historiador Salloma Salomão Jovino da Silva, doutor pela PUC/SP e coordenador de cursos de formação referenciados na lei 10.639/03. "Outros professores, que já trabalhavam anteriormente com estes conteúdos, passaram a ser mais respeitados e ouvidos em suas escolas".

Outros exemplos também denotam esse movimento: o Exército Brasileiro implementou nas suas escolas os conteúdos previstos na lei através de uma resolução; e de acordo com o Censo das Escolas Católicas no Brasil, organizado pelo Centro de Estatística Religiosa e Investigações Sociais (CERIS) em 2005, o tema do racismo recebe maior atenção no planejamento escolar quando comparado a outros, como promoção da saúde e meio ambiente, e é inserido tanto em projetos pedagógicos quanto em disciplinas curriculares.

As mudanças, porém, ocorreram em amplitude insuficiente para efetivar a implementação da lei 10.639/03 em nível nacional. Não foi realizada ainda uma pesquisa quantificando o número de instituições de ensino brasileiras que estão cumprindo a LDB de acordo com as alterações feitas pela lei 10.639/03. Há, no entanto, consensos em vários aspectos sobre como está a situação atual, de acordo com os entrevistados desta reportagem. Entre estes, a de que há professores, gestores e alunos que desconhecem a existência desta obrigatoriedade e/ou das diretrizes curriculares que as orientam, a formação inicial e continuada docente sobre o tema deixa a desejar e não há material didático-pedagógico adequado acessível a todos.

"Na prática, a implementação da lei 10.639 não atende ao que esperávamos após cinco anos, embora tenha havido avanços", avalia Petronilha Beatriz Gonçalves e Silva, professora titular da disciplina de Ensino-Aprendizagem das Relações Étnico-Raciais da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar). Ex-integrante do Conselho Nacional de Educação, ela foi a relatora responsável pelo parecer que instituiu as diretrizes curriculares vinculadas à lei. "A sociedade brasileira gosta de fingir que não somos multiculturais. Essa mudança de mentalidade requerida pela lei, que implica quebra de preconceitos, de privilégios, faz com que a sua implantação não tenha a extensão requerida".

Salloma Salomão concorda com a percepção de Petronilha: "Certamente há um embate vinculado a uma concepção de escola eurocêntrica. Quando você leva para a sala de aula elementos ligados à origem africana, que têm muito a ver com o pertencimento das crianças que estão ali, mas que a escola não os reconhece, ocorre um embate cultural. Existe uma hierarquização histórica na relação dos descendentes de europeus com os indígenas, os negros e os mestiços". Para ele, "na verdade o que está em marcha é um questionamento radical do modelo de educação, dos espaços sociais historicamente destinados aos negros, algo até mais amplo que a lei (10.639/03). E a escola tem um grande papel nisso. Ela tem sido um instrumento de controle, de apaziguamento social, que não pressupõe mudanças nas hierarquias".
Uma outra razão importante para essa lentidão é a descontinuidade das políticas públicas em todas as esferas governamentais, com raras exceções, o que inclui a pequena atuação de boa parte dos conselhos de educação estaduais e municipais na tarefa de acompanhar a implementação da lei, além falta de orçamento para viabilizar ações. "Existem mais iniciativas da sociedade civil em implementar a lei do que do poder público", afirma Billy Malachias, do CEERT. "Primeiro porque há dentro dos diferentes governos uma idéia de que isso é absolutamente desnecessário, ou seja, que a educação por si só já contempla o que está previsto na lei. Segundo, não há uma política de Estado para a sua implementação".

Para Tania Portella, da Ação Educativa, "o grande desafio mesmo é a vontade política, que envolve definição de dotação orçamentária em todos os âmbitos - federal, estadual e municipal - para produção e disseminação de material, para a formação inicial e continuada, e de núcleos estruturados dentro da gestão que possam fazer o acompanhamento dessa implementação, avaliando o que está dando certo e o que não está".

André Lázaro, Secretário da SECAD/MEC, reconhece que há falhas: "A crítica à falta de uma política de Estado é justa. Eu acho que temos feito muita coisa, mas esse conjunto de iniciativas não demonstrou sistematicidade, organicidade. Esperamos que os Diálogos Regionais trabalhem nessa direção. Acho que podemos investir mais, e um bom plano de metas vai nos fazer investir melhor".

"Investir na formação de professores"

Num rol de ações práticas e prioritárias com a finalidade de implementar a lei, Salloma Salomão sugere: "Investir na formação de professores e mudar a estrutura curricular do ensino superior. É preciso formar educadores dispostos, abertos a desvelar e compreender a África, os africanos na diáspora, para além do estereótipo de que hoje a África é um lugar de miséria e de guerra étnica. Esses e outros estereótipos ainda predominam nas instituições de ensino, sem dúvida.", afirma.

O advogado Humberto Adami complementa: "os conteúdos referentes às leis 10.639 e 11.645 devem começar a ser cobrados em todos os concursos para profissionais da educação e inclusive nos vestibulares".

"Várias ações precisam ser feitas concomitantemente", opina Tania Portella. "É realmente necessário um movimento conjunto - da sociedade civil, dos profissionais da educação, das instâncias governamentais de todos os âmbitos, dos gestores no geral, escolares e político-administrativos. O envolvimento de todos estes atores é essencial para garantir a implementação adequada da lei 10.639".

Diretrizes curriculares ainda são desconhecidas pela comunidade escolar

As Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação das Relações Étnico-Raciais e para o Ensino de História e Cultura Africana e Afro-Brasileira apresentam orientações, princípios e fundamentos para o planejamento, execução e avaliação dos conteúdos previstos pela lei 10.639/03.
Elas são destinadas a toda a comunidade escolar e sua elaboração apóia-se em marcos legais, como a Constituição Brasileira, o Estatuto da Criança e do Adolescente e o Plano Nacional de Educação, além de uma consulta que contou com a participação de 250 pessoas, entre crianças e adultos, mulheres e homens. Trabalham temas como a consciência política e histórica da diversidade e ações educativas de combate ao racismo e discriminações, especificando conteúdos e formas de abordagem no ambiente escolar.

Para a educadora Petronilha Beatriz Gonçalves e Silva, embora as Diretrizes tenham sido bem recebidas, grande parte da comunidade escolar ainda não as conhecem, o que ajuda a dificultar o processo de implementação da lei: "A SECAD fez uma ampla divulgação, mas ainda hoje o parecer vai para a biblioteca e não chega nas mãos do professor, não é divulgado nas escolas", diz ela. A opinião de Petronilha é ratificada pelos outros entrevistados dessa reportagem, incluindo o representante da SECAD/MEC.

Inclusão da cultura afro-descendente nas escolas: um desafio à parte
"Há uma tendência de se retrabalhar nas escolas sempre os mesmos ícones da cultura afro-brasileira, como a capoeira e o candomblé. Entre eles existe todo um universo que se perde, que realmente dá essa dimensão da enorme presença africana na cultura brasileira". Essa é a opinião do etnomusicólogo Paulo Dias, presidente da Associação Cultural Cachuera!, organização especializada na pesquisa e divulgação da cultura popular tradicional brasileira de origem afro-descendente. Para ele, a introdução da cultura africana e afro-brasileira dentro nos currículos das instituições de ensino é um grande desafio.

A barreira da escola em trabalhar com este conteúdo é produzida por vários fatores, segundo Paulo. Um deles é a maciça presença da cultura hegemônica, de matriz européia, nas instituições de ensino, "agora voltadas para os Estados Unidos, mas o fundo é ainda é europeu. A versão contemporânea dessa hegemonia é a da cultura do consumo, se é que se pode chamar isso de cultura", diz ele.

"Os africanos e afro-descendentes têm formas próprias de expressão artística, têm uma visão de mundo diferente da do europeu. É mais simples apagar a diferença e colocar a cultura afro-descendente numa vala comum do folclore, do povo primitivo, etc., do que você considerar a diferença na sociedade. É aquela filosofia do 'negro em seu lugar'; na verdade, uma estratégia de dominação que perpassa a história e a cultura do Brasil, desde a escravidão até hoje", complementa.
Para o pesquisador, diversas manifestações da cultura afro-brasileira revelam a resistência dos povos africanos em manter a essência de suas crenças e visão de mundo. "E pensando em escola", sugere Paulo, "existe todo um cancioneiro que é mantido nas congadas, nos jongos, em várias tradições de matriz africana; são músicas que estão sendo cantadas há séculos, celebrando valores de resistência e as memórias do sofrimento, mas da superação do sofrimento também. Elas são riquíssimas e poderiam ser trabalhadas por essa perspectiva, principalmente no campo da História, mas também na música, nas artes, na dança, na educação física, porque esse cancioneiro é associado a formas expressivas onde coexistem a dança, o canto, os tambores, a mímica, o teatro, a riqueza das indumentárias - enfim, todo o simbolismo dessas formas de expressão que normalmente o ocidental europeu considera como formas autônomas, e que o africano vê como formas que coexistem".

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Lei 11.645/08: para conhecer os povos indígenas de hoje

Há dez anos a antropóloga Artionka Capiberibe estava na aldeia Kumenê, dos índios palikur, na Terra Indígena do Uaçá, no Amapá. Era 19 de abril, Dia do Índio. Qual não foi sua surpresa quando a professora da escola local, não-índia, organizou as crianças para produzirem cocares com uma pena de papel, de inspiração norte-americana, seguindo uma conduta também adotada em escolas de educação infantil brasileiras nesse dia. O episódio é emblemático tanto por expor um dilema referente à educação indígena, como por evidenciar a reprodução de estereótipos quanto ao que sempre se ensinou e se aprendeu nas escolas brasileiras, via de regra, sobre a história e a cultura dos povos indígenas que habitaram e ainda habitam o país.
A promulgação da lei 11.645/08, que altera a LDB, ratifica e amplia a lei 10.639/03, instituindo a obrigatoriedade do ensino da história e cultura indígena nas escolas de educação básica, é justificada pelo governo federal com o objetivo de combater estereótipos presentes nas escolas e reforçar a valorização da diversidade nacional. "Temos uma idéia abstrata de índio, e é importante que possamos enxergar quem são os povos indígenas brasileiros no presente. Até bem recentemente houve aqui extermínio de grupos indígenas. O Brasil tem que acordar rápido para essa questão; além disso, conhecer e celebrar a grande riqueza cultural que temos, e a educação tem que expressar isso", afirma André Lázaro, Secretário da SECAD/MEC.
Segundo dados do IBGE (1999/2000), a população brasileira indígena é de 734 mil pessoas - mas esse é um dado controverso, uma vez que há censos de outras instituições que apontam para uma população atual de 350 mil indígenas. Em 1500, quando Pedro Álvares Cabral aportou por aqui, os indígenas eram estimados em 5 milhões, compondo mais de 1,5 mil povos, que falavam mais de mil línguas distintas entre si. Na década de 1970 eles estavam reduzidos a 250 mil. O fortalecimento do movimento indígena, ladeado pela Constituição de 1988, que garantiu direitos aos seus povos, permitiu o crescimento desta população nas últimas décadas.

No livro "O Índio Brasileiro: o que você precisa saber sobre os povos indígenas no Brasil de hoje" (UNESCO/MEC/Fundação Ford/Museu Nacional), o índio baniwa Gersem dos Santos Luciano indica a existência de 222 povos que falam 180 línguas diferentes entre si. Entre estes povos, 61 são formados por grupos inferiores a 200 pessoas, ou seja, estão ameaçados de exinção étnica. Do total da população indígena existente, 60% vive na Amazônia e 13% do território nacional é indígena.

O Congresso Nacional foi o proponente da lei 11.645/08, que, diferentemente da 10.639/03, não passou por um período anterior e longo de debates. André Lázaro ficou sabendo dela quando já estava publicada. "Nem fui informado de sua tramitação", diz ele. "Mas isso não tira o mérito da lei. É justa do ponto de vista do seu interesse. Deve ser cumprida".

Surpresa, alegria e cautela

Entre os índios e não-índios ligados ao estudo e divulgação da história e cultura dos povos indígenas brasileiros, a lei 11.645/08 foi recebida com surpresa, alegria e cautela. "Ninguém respeita aquilo que não conhece. O índio que se aprende nas escolas é o do passado, a história e cultura indígena que é ensinada parece um conto de fadas. É muito vergonhoso que outros países do mundo conheçam melhor do que os brasileiros os povos indígenas daqui", afirma Jurandir Siridiwê Xavante, presidente do Instituto das Tradições Indígenas (IDETI), organização criada e dirigida por índios de várias etnias que divulga a cultura indígena e desenvolve projetos culturais e educacionais junto a alguns povos, como os bororo e os guarani. "Por isso a lei é bem-vinda".

"Acredito que a promulgação da lei foi um ganho muito importante para aproximar a sociedade brasileira dos povos indígenas", opina o escritor Daniel Munduruku. "Já faz algum tempo que o movimento indígena vem reivindicando a criação de um dispositivo que pudesse dar maior visibilidade à história de nossos povos, por isso acredito que esse passo é fundamental".
Um preocupação reside na adoção efetiva da lei."Vivemos num país de muitas leis e pouco cumprimento. Não creio que mais uma lei resolva, mas certamente ela é um start para que a sociedade se mobilize", diz Munduruku. A antropóloga Artionka Capiberibe, doutoranda do Museu Nacional/UFRJ e pesquisadora de longa data dos índios da etnia palikur, pensa de forma semelhante: "A aplicação das leis aqui no Brasil é complicada. Mas a partir do momento em que esta lei (11.645/08) foi instituída, os movimentos sociais e indígenas passaram a poder, legitimamente, fazer pressão para que ela seja implementada".

"Eu tenho imensa reserva quando vejo propostas de mudança curriculares que não vêm ancoradas em estratégias que apóiem os professores a melhorar seu trabalho. Essa me parece mais uma delas. Muda-se a lei e espera-se que a realidade mude com ela. Não é assim na vida real", afirma o antropólogo Luis Donisete Benzi Grupione, pesquisador- associado do Núcleo de História Indígena e do Indigenismo da Universidade de São Paulo (USP), autor de livros de referência sobre o tema e consultor do MEC para educação indígena. "Creio que nem as escolas, nem os professores tomaram conhecimento dessa lei. Por isso é importante que o MEC e as Secretarias Estaduais de Educação proponham ações para que a lei ganhe efetividade. Sem esse esforço, continuamos no velho e surrado bordão, da larga distância entre o que diz a lei e o que ocorre na prática".

André Lázaro informa que, entre as ações iminentes do Governo Federal pela implementação da lei, estão a abertura de um edital para a elaboração de livros didáticos sobre história e cultura indígena, programada para este ano, e o início da elaboração de diretrizes curriculares para a temática, pelo Conselho Nacional de Educação."Nos últimos anos temos dado atenção especial à educação indígena, o que incluiu a produção de livros, em parceria com universidades, que poderão ser aproveitados para o ensino da história e cultura indígena em toda a educação básica", diz ele."Também temos um acúmulo referente à lei 10.639, que certamente vai nos ajudar na implementação da 11.645".

"As escolas devem ouvir os indígenas"

Quais os conteúdos e os tipos de abordagem mais adequados para se apresentar a história e a cultura dos povos indígenas nas escolas? O que deve mudar prioritariamente no ensino? Foram perguntas que fizemos a entrevistados desta reportagem, que deram várias sugestões.

"As escolas podem tratar da diversidade dos povos indígenas que existem hoje em seus próprios Estados", opina Jurandir Siridiwê Xavante. "O meu Estado, por exemplo, é o de Mato Grosso. Lá existem 42 povos indígenas. Quem vive em Mato Grosso conhece esses povos? Não".
Daniel Munduruku concorda: "É preciso mostrar a cultura indígena como individualidades, e não com esta cínica maneira de conhecer nossos povos. Deve-se banir a generalização, pois isso acaba alimentando o estereótipo e o preconceito". Para ele, "sem a formação adequada dos professores nada irá acontecer efetivamente".

Ele sugere, como conteúdos primordiais a serem trabalhados nas escolas: "Aspectos da pré-história brasileira - de onde vieram os indígenas; as ondas migratórias e as diferenças que isso geraram; onde estão localizados os povos indígenas; como era a vida e sua relação com a natureza, e como está isso hoje; qual a contribuição dos povos indígenas para a cultura brasileira". E completa: "as escolas devem ouvir os indígenas; as escolas devem ler os povos indígenas".
Para Artionka Capiberibe, "é preciso diminuir o desconhecimento generalizado sobre a história da participação dos índios na formação do Brasil".

E Luiz Donisete Grupioni enfatiza: "A escola trata mal a questão indígena, seja em termos do passado, seja do presente. Portanto o primeiro desafio que essa lei coloca diz respeito a uma mudança de paradigma no tratamento da diversidade étnica e cultural formativa do país", afirma. "Penso que se esta lei permitir um novo olhar sobre os índios, esse olhar deve ser marcado pelo reconhecimento da enorme sociodiversidade que existiu e existe no país, de 1500 aos dias de hoje. Portanto, um enfoque prioritário para os professores é acabar com a visão de que todos os índios moram em ocas e tabas e falam tupi".

Perspectiva de aproximação

O trabalho que já foi realizado para implementar a lei 10.639/03 tende a abrir caminhos para a lei 11.645/08 e, talvez, criar uma aproximação maior entre os que estão trabalhando por ambas as causas. "Admiro o que está sendo feito pelos negros na divulgação da lei (10.639/03)", diz Jurandir Siridiwê Xavante.

"Estamos planejando ouvir as lideranças indígenas, os movimentos indígenas que trabalham na perspectiva da educação, para saber qual o interesse deles em torno da lei 11.645", diz Tania Portella, da Ação Educativa.

Para Humberto Adami, do IARA, negros e índios têm suas próprias especificidades históricas e culturais, que devem ser respeitadas no âmbito da implementação destas leis, mas também demandas semelhantes, "como o fim do preconceito e estigmatização e o acesso aos direitos fundamentais, como saúde e moradia. Isso sem contar que, durante a história do Brasil, eles muitas vezes lutaram juntos e contra as mesmas injustiças".

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Saiba um pouco mais sobre as iniciativas citadas no início desta reportagem

. Na Escola Creche Vovô Zezinho, em Salvador (BA), a professora Rita de Cássia Silva Santos partiu da leitura e adaptação de seis contos de origem africana para nortear seu trabalho, que incluiu relatos, fotos e desenhos das crianças. Por exemplo, com o conto "Bruna e a Galinha D'Angola", de Gercilga de Almeida, foram trabalhados aspectos relacionados à arte de origem africana através da confecção de panos com retalhos de tecidos. O projeto, baseado no resgate da cultura oral, buscou mostrar que existem histórias de diferentes povos e valorizar o grupo étnico-racial ao qual pertencem as crianças da escola.

. Na Escola Municipal de Ensino Fundamental José Pereira de Borba, em Itapecirica da Serra (SP), todos os professores trabalham com temas como história da África e relações étnico-raciais desde 2007, dentro do Projeto "África - um pouco de todos nós". O conteúdo foi inserido no projeto político-pedagógico e debatido com os pais dos alunos, que aceitaram a proposta, mesmo a escola tendo um número proporcionalmente menor de crianças negras. O trabalho, estruturado a partir de textos de literatura infanto-juvenil, desdobrou-se em debates na sala de aula sobre preconceito, lições sobre o continente africano, produção de textos, uma exposição de instrumentos e visitas ao Museu Afro, em São Paulo.

. A Universidade do Estado de Santa Catarina (UDESC) mantém um Núcleo de Estudos Afro-Brasileiros (NEAB) desde 2003. Os trabalhos acadêmicos produzidos pelos professores a ele vinculados cobrem grande parte da experiência das populações afro-descendentes da região nos séculos XIX e XX. O NEAB também foi responsável pela criação de disciplinas referenciadas em conteúdos relacionados à lei 10.639/03, em cursos de licenciatura e extensão da universidade.

*Jornalista, trabalha para Associação Cultural Cachuera! na área de comunicação; é apresentadora/entrevistadora do programa Educação na TV, da APEOESP. E-mail: maremar@uol.com.br

Fonte: Rede 3Setor em nome de Renata Celani (maremar@uol.com.br)

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Lula elogia marinheiro, e Marinha volta a criticar revolta liderada por ele

(21/11/2008 - 15:26)

MÁRIO MAGALHÃES
DA SUCURSAL DO RIO

Na antevéspera do aniversário de 98 anos da Revolta da Chibata, o presidente Lula participou ontem no Rio da inauguração de uma estátua do líder da rebelião, o marinheiro de primeira classe João Cândido Felisberto (1880-1969).
A Marinha se ausentou do ato e, em resposta a perguntas da Folha, voltou a criticar o marinheiro que Lula, o comandante das Forças Armadas, qualificou como "herói". "Precisamos aprender a transformar os nossos mortos em heróis", discursou o presidente na praça 15, no centro, onde foi instalada a obra do artista Walter Brito.
Duas horas antes, o Centro de Comunicação Social da Marinha afirmou não reconhecer "heroísmo nas ações daquele movimento. Entretanto, nada tem a opor à colocação da estátua, desde que haja o cuidado de evitar inserções ofensivas à Força e às vítimas dos amotinados". O Ministério da Defesa não enviou representante.
Em julho, Lula sancionou a anistia póstuma a João Cândido. O evento de ontem integrou os festejos do Dia da Consciência Negra -o homenageado era negro. O presidente disse que quer transformar o 20 de novembro em feriado nacional.
Em 22 de novembro de 1910, sob a liderança de João Cândido, ao menos 2.000 marinheiros se sublevaram contra os castigos físicos. A gota d'água foi o anúncio da punição de 250 chibatadas contra um deles. A revolta durou quatro dias. Morreram quatro oficiais a bordo e duas crianças em terra -a cidade foi bombardeada.
A Marinha disse ontem que se tratou de "um triste episódio da história do país".
Meses depois, João Cândido foi preso com 17 companheiros -16 foram assassinados. Expulso da Armada, sobreviveu na pobreza. Ontem foi chamado de "Almirante Negro". A estátua fica de frente para a baía de Guanabara, onde estavam os quatro navios de guerra que os rebelados tomaram.
Ao citar o "herói" João Cândido, Lula elogiou opositores da ditadura militar (1964-85) e disse que as novas gerações precisam conhecê-los. "[Carlos] Marighella não morreu por ser bandido", disse Lula sobre o guerrilheiro morto em 1969. "Morreu porque acreditava numa causa." Também exaltou o militante comunista Gregório Bezerra.

Fonte: Fundação Cultural Palmares

Saiba mais sobre quem foi Zumbi dos Palmares

Spensy Pimentel
Repórter da Agência Brasil

Brasília - Zumbi dos Palmares, cuja morte, em 20 de novembro de 1695, motiva a celebração, amanhã (hoje), em todo o país, do Dia da Consciência Negra, foi um dos líderes do Quilombo dos Palmares, o mais conhecido núcleo de resistência negra à escravidão no país.

Segundo cronologia publicada na página da Secretaria Especial de Políticas de Promoção da Igualdade Racial (Seppir), órgão ligado à Presidência da República, Palmares surgiu a partir da reunião de negros fugidos da escravidão nos engenhos de açúcar da Zona da Mata nordestina, em torno do ano de 1600. Eles se estabeleceram na Serra da Barriga, onde hoje é o município de União dos Palmares (AL). Ali, devido às condições de díficil acesso, puderam organizar-se em uma comunidade que, estima-se, chegou a reunir mais de 30 mil pessoas

Muitos dos quilombolas eram índios e brancos pobres, como conta texto na página da internet da Fundação Joaquim Nabuco, outro órgão federal, com sede em Recife. Nabuco foi expoente do movimento abolicionista. "A vida de Zumbi, o rei do Quilombo dos Palmares, é pouco conhecida e envolta em mitos e discussões", alerta o texto - vários dos trechos abaixo, portanto, são objeto de polêmicas entre os historiadores.

Ao longo do século 17, Palmares resistiu a investidas militares dos portugueses e de holandeses - que dominaram parte do Nordeste de 1630 a 1654. Segundo o historiador Pedro Paulo Funari, no artigo "A República de Palmares e a Arqueologia da Serra da Barriga", em 1644, um ataque holandês vitimou 100 pessoas e aprisionou 31, de um total de 6 mil que viviam no quilombo.

Funari também afirma que o quilombo (termo derivado de língua da região de Angola) era chamado pelos portugueses de República dos Palmares, nos documentos da época, e termos como mocambo foram posteriormente utilizados no sentido pejorativo. O quilombo era composto por várias aldeias, de nomes africanos, como Aqualtene, Dombrabanga, Zumbi e Andalaquituche, indígenas, como Subupira, ou Tabocas, e portugueses, como Amaro. A capital era Macacos, termo de origem incerta (pode ser português ou corrutela do banto macoco).

Zumbi nasceu livre, em Palmares, provavelmente em 1655, e, segundo historiadores, seria descendente do povo imbamgala ou jaga, de Angola. Ainda na infância, durante uma das tentativas de destruição do quilombo, ele foi raptado por soldados portugueses e teria sido dado ao padre Antonio Melo, de Porto Calvo (hoje, em Alagoas), que o batizou de Francisco e ensinou-lhe português e latim. Aos dez anos tornou-o seu coroinha.

Com 15 anos, Francisco foge, retorna a Palmares e adota o nome de Zumbi - termo de significado incerto. O nome de Zumbi apareceu pela primeira vez em 1673, em relatos portugueses sobre a expedição chefiada por Jácome Bezerra, que foi desbaratada pelos quilombolas.

Aos 20 anos, Zumbi destacou-se na luta contra os militares comandados pelo português Manuel Lopes. Nesses combates, chegou a ser ferido com um tiro na perna.

Em 1678, o governador de Pernambuco, Pedro de Almeida, propõe a Palmares anistia e liberdade a todos os quilombolas. Segundo o historiador Edison Carneiro, autor do livro "O Quilombo dos Palmares", ao longo dos quase 100 anos de resistência dos palmarinos, foram inúmeras as ofertas como essa.

Ganga Zumba (possivelmente um título - nganga significa sacerdote, e nzumbi "possui conotações militares e religiosas", segundo Funari), então líder de Palmares, concorda com a trégua, enquanto Zumbi é contra, por argumentar que o acordo favoreceria a continuidade do regime de escravidão praticado nos engenhos. Zumbi vence a disputa, é aclamado líder pelos que discordavam do acordo e, aos 25 anos, torna-se líder do quilombo.

Ao longo da vida, Zumbi teria tido pelo menos cinco filhos. Uma das versões diz que ele teria se casado com uma branca, chamada Maria. Ao longo de seu reinado, Zumbi passou a comandar a resistência aos constantes ataques portugueses.

Em 1692, o bandeirante paulista Domingo Jorge Velho, uma espécie de mercenário da época, comandou um ataque a Palmares e teve suas tropas arrasadas. O quilombo foi sitiado e só capitulou em 6 de fevereiro de 1694, quando os portugueses invadem o principal núcleo de resistência, a Aldeia do Macaco.

Ferido, Zumbi foge. Baleado, ele teria caído de um desfiladeiro, o que deu origem à história de que teira se suicidado para evitar a prisão. Resistiu na mata por mais de um ano, atacando aldeias portuguesas. Em 20 de novembro do ano seguinte, depois de ser traído por um antigo companheiro, Antonio Soares, Zumbi é localizado pelas tropas portuguesas.

Preso, Zumbi é morto, esquartejado, e sua cabeça é levada a Olinda para ser exposta publicamente. Entre outros objetivos, o de acabar com os boatos que corriam entre os negros escravizados do litoral de que o líder quilombola era imortal.

Fonte: Agência Brasil

Rio de Janeiro é palco de uma série de comemorações em memória a Zumbi

Flávia Villela
Repórter da Agência Brasil

Rio de Janeiro - Diversas atividades estão sendo realizadas durante o dia de hoje (20) em diferentes bairros e regiões do Rio de Janeiro em memória a Zumbi, líder do Quilombo dos Palmares, em Alagoas,  morto em 20 de novembro de 1695, consagrado como Dia da Consciência Negra. O Rio de Janeiro foi o primeiro município a decretar feriado em homenagem a Zumbi dos Palmares, em 1995.

A programação começa às 9h, na Avenida Presidente Vargas, no centro da cidade, onde grupos de cultura afro farão apresentações diante do monumento a Zumbi dos Palmares..
O Dia da Consciência Negra também será comemorado no Ponto Chic, em Padre Miguel, na Zona Oeste. Neste ano a festa, que já está na oitava edição, vai homenagear o presidente eleito dos Estados Unidos, Barack Obama, em frente ao busto de Zumbi.

As atividades começam às 9 da manhã com uma missa afro e apresentações de grupos folclóricos e de capoeira, jongo e maculelê. Também estão previstos shows de charm, hip hop, soul, funk, samba de roda, e a participação da bateria da escola de samba Mocidade Independente de Padre Miguel. O cantor Elymar Santos encerra o evento.

O Centro Cultural Casa de Jorge, em Água Santa, no subúrbio, vai homenagear Zumbi dos Palmares com feijoada e apresentações de capoeira, black music e da escola de samba Império Serrano. O evento começa ao meio-dia.

Na Praça XV, no centro da cidade, uma cerimônia homenageia João Cândido, conhecido como Almirante Negro, que liderou a Revolta da Chibata de 1910, para protestar contra os castigos físicos que os marinheiros negros sofriam, mesmo depois do fim da escravidão, em 1988.

A solenidade contará com a presença do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que assinou neste ano a anistia póstuma a João Cândido e demais líderes da Revolta da Chibata.

A programação tem início às 14h com shows de Noca da Portela, Nelson Sargento, Dona Ivone Lara e Neguinho da Beija-Flor. Às 17h será inaugurada a Estátua de João Cândido. O encerramento, às 19h30min, será com show de João Bosco e Martinho da Vila.

Fonte: Agência Brasil

Negro ganha menos do que os não negros, segundo pesquisa do Seade/Dieese

19/11/2008 Folha de S. Paulo

Clipping: Renda do negro é metade da do não-negro

Segundo pesquisa Seade/Dieese, negro tem rendimento médio de R$ 4,36 por hora em SP; não-negro recebe R$ 7,98

Causas da diferença são o menor acesso à educação e o preconceito, que impede o negro de subir na carreira, segundo os especialistas

O trabalhador negro (preto e pardo) ganha apenas cerca da metade do que o não-negro (branco e amarelo) recebe na Grande São Paulo. São R$ 4,36 por hora, em média, contra R$ 7,98, segundo pesquisa realizada pela Fundação Seade e pelo Dieese.

Quanto maior o nível escolar, maiores as disparidades. O rendimento real do indivíduo negro que não concluiu o ensino fundamental é de R$ 3,44 por hora, e o do não-negro, R$ 4,10 -uma diferença de 19,2%.
Já na comparação entre duas pessoas que terminaram a universidade o abismo atinge 40%: o negro recebe R$ 13,86 por hora e o não-negro, R$ 19,49. O levantamento foi realizado em 2007, mas os valores tiveram correção monetária até julho.

"Considerando a média de R$ 4,36 por hora e o fato de que o negro escravo do Brasil Imperial contava com a renda indireta da comida e da moradia, pode-se falar que nada mudou", argumenta o presidente da ONG Afrobras e reitor da Unipalmares (Universidade da Cidadania Zumbi dos Palmares), José Vicente.
No que diz respeito ao desemprego, a situação apresentou pequena melhora nos últimos dez anos. Em 1999, a porcentagem de negros desempregados era de 24,3% ante 16,8% dos não-negros. No ano passado, as taxas estavam em 17,6% e 13,3%. O Dieese diz que a tendência é semelhante no resto do país, porém os números mudam segundo a composição étnica da população local.

"O crescimento da economia do país desde 2004 criou vagas para os negros. Algumas diferenças, entretanto, não se desfazem ao longo do tempo", diz Patrícia Lino Costa, coordenadora da pesquisa.

O indicador "mais preocupante", aponta, é o que mostra a distância entre os ganhos dos negros e dos não-negros que fizeram faculdade. O restrito acesso à escola é uma das principais causas da desigualdade no mercado de trabalho, mas, para quem conseguiu superá-la, o preconceito acaba sendo o pior obstáculo, afirma. Uma vez contratado por uma empresa, o trabalhador negro não consegue galgar posições e subir na carreira, daí a sua renda ser inferior à dos brancos que sobem na hierarquia, diz ela.
"Os negros não conseguem sequer entrar em um cargo mais elevado. Entre um engenheiro negro e um branco, certamente prefere-se contratar o branco, achando que o negro não é capaz", afirma Vicente.
"Na minha opinião, trata-se da dificuldade em lidar com o diferente", resume Costa. "Existe um perfil de trabalhador que o mercado recebe melhor: homem branco, entre 25 e 39 anos. Ou seja, negros são discriminados, mulheres, homens muito novos ou mais velhos."

Por isso, de acordo com os especialistas, a redução das disparidades começa na educação fundamental, para que as crianças aprendam desde cedo a lidar com as diferenças. Para Vicente, as cotas em escolas técnicas e nas universidades ajudam, porém deveriam ser uma "verdadeira política de Estado, e não fruto apenas da boa vontade de um grupo de reitores". As empresas, por sua vez, estão aumentando os seus programas de inclusão, diz Costa.

"O problema é a velocidade do avanço. No Brasil, que se orgulha da sua miscigenação, números como esses de renda e emprego são chocantes. Os EUA, onde até 50 anos atrás um negro não podia beber água no mesmo bebedouro de um branco, acabaram de eleger um negro presidente. Falta seriedade ao nosso governo", diz Vicente.
Denyse Godoy
19/11/2008

Fonte: Repórter Brasil

Seppir comemora 20 de novembro na Praça XV

Como parte das comemorações do Dia da Consciência Negra, a SEPPIR - Secretaria Especial de Políticas de Promoção da Igualdade Racial da Presidência da República, dirigida estará promovendo vasta programação na Praça XV - Centro do RJ.

Abaixo a programação divulgada pela SEPPIR:

seppir

Para marcar o Dia da Consciência Negra, a SEPPIR vai promover em 20 de novembro uma atividade cultural na Praça XV, no Centro do Rio de Janeiro, palco da Revolta da Chibata de 1910. O ponto alto do evento será a instalação de monumento em homenagem a João Cândido, o “Almirante Negro”, que liderou a Revolta da Chibata de 1910.

Na estátua, criada pelo artista plástico Walter Brito, o Almirante Negro segura o leme em uma das mãos. A outra, aponta para o mar. A estátua foi instalada nos jardins do Museu da República, no Rio, e será deslocada esta semana para a Praça XV.

A programação tem início às 14h com shows de Noca da Portela, Nelson Sargento, Dona Ivone Lara e Neguinho da Beija-Flor. Às 16h haverá o lançamento do Projeto Memória da Fundação Banco do Brasil –  “João Cândido, a luta pelos direitos humanos”. Às 17h será inaugurada a Estátua de João Cândido. Na seqüência teremos a saudação de Candinho, filho de João Cândido, do ministro Edson Santos e do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que este ano assinou a anistia póstuma a João Cândido e demais líderes da Revolta da Chibata. O encerramento, às 19h30min, será com show de João Bosco e Martinho da Vila.

Veja ainda a programação em outros cantos deste nosso Brasil:

Pelo país – Com o apoio da SEPPIR, outras comemorações serão realizadas em várias cidades do país. Em São Paulo (SP), o Fórum Estadual de Entidades Negras promove a Marcha da Consciência Negra, nesta quinta-feira (20/11), com ponto de partida no MASP, na Avenida Paulista. Com a participação de vários setores da sociedade, o objetivo do evento é mostrar a necessidade de garantir igualdades materiais e de condições entre brancos e negros através de políticas públicas verticais e horizontais.

Em Salvador (BA) acontece a XXIX Marcha Zumbi dos Palmares. Produzida pela Coordenação Nacional de Entidades Negras (CONEN), a caminhada tem saída às 15h da Praça do Campo Grande em direção à Praça Municipal.

Florianópolis (SC) vai comemorar o Dia da Consciência Negra com uma série de atividades no Largo da Alfândega, no Centro. A abertura oficial do evento, promovido pela Coordenadoria de Políticas de Promoção da Igualdade Racial, da Prefeitura, será nesta terça-feira no Espaço Cultural Rita Maria.

Em Belo Horizonte (MG), a Fundação Municipal de Cultura preparou uma programação especial, que segue até o dia 26, com espetáculos, exibições de vídeos, exposições e palestras, além de debates e contação de histórias em diversos espaços culturais por toda a cidade. Em Juiz de Fora haverá o VI Encontro 20 de novembro, com o tema “Consciência tem cor?”, no próximo sábado (22/11). O evento será realizado na sede campestre do Sintufejuf, na Vila Ideal, e prevê palestras e atividades culturais. Em Paracatu, várias ações marcam a III Semana da Consciência Negra até o dia 21, com destaque para a apresentação de teatro “Yabás”, no Cine Teatro Santo Antônio, às 15h.
No Maranhão, a XXIV Semana da Consciência Negra prossegue até o dia 29 de novembro. Seminários, exposição, maratona cultural e uma marcha vão movimentar a capital São Luís.

Fonte: SEPPIR

E se Obama fosse africano?

Crônica

E se Obama fosse africano?

"(...) Não somos capazes de ver os nossos próprios racismos e xenofobias. Na pressa de condenar o Ocidente, esquecemo-nos de aceitar as lições que nos chegam desse outro lado do mundo".

Mia Couto *

Os africanos rejubilaram com a vitória de Obama. Eu fui um deles. Depois de uma noite em claro, na irrealidade da penumbra da madrugada, as lágrimas corriam-me quando ele pronunciou o discurso de vencedor. Nesse momento, eu era também um vencedor. A mesma felicidade me atravessara quando Nelson Mandela foi libertado e o novo estadista sul-africano consolidava um caminho de dignificação de África.

Na noite de 5 de Novembro, o novo presidente norte-americano não era apenas um homem que falava. Era a sufocada voz da esperança que se reerguia, liberta, dentro de nós. Meu coração tinha votado, mesmo sem permissão: habituado a pedir pouco, eu festejava uma vitória sem dimensões. Ao sair à rua, a minha cidade se havia deslocado para Chicago, negros e brancos respirando comungando de uma mesma surpresa feliz. Porque a vitória de Obama não foi a de uma raça sobre outra: sem a participação massiva dos americanos de todas as raças (incluindo a da maioria branca) os Estados Unidos da América não nos entregariam motivo para festejarmos.
Nos dias seguintes, fui colhendo as reacções eufóricas dos mais diversos recantos do nosso continente. Pessoas anónimas, cidadãos comuns querem testemunhar a sua felicidade. Ao mesmo tempo fui tomando nota, com algumas reservas, das mensagens solidárias de dirigentes africanos.

Quase todos chamavam Obama de "nosso irmão". E pensei: estarão todos esses dirigentes sendo sinceros?

Será Barack Obama familiar de tanta gente politicamente tão diversa? Tenho dúvidas. Na pressa de ver preconceitos somente nos outros, não somos capazes de ver os nossos próprios racismos e xenofobias. Na pressa de condenar o Ocidente, esquecemo-nos de aceitar as lições que nos chegam desse outro lado do mundo.

Foi então que me chegou às mãos um texto de um escritor camaronês, Patrice Nganang, intitulado: " E se Obama fosse camaronês?". As questões que o meu colega dos Camarões levantava sugeriram-me perguntas diversas, formuladas agora em redor da seguinte hipótese: e se Obama fosse africano e concorresse à presidência num país africano? São estas perguntas que gostaria de explorar neste texto.

E se Obama fosse africano e candidato a uma presidência africana?
1. Se Obama fosse africano, um seu concorrente (um qualquer George Bush das Áfricas) inventaria mudanças na Constituição para prolongar o seu mandato para além do previsto. E o nosso Obama teria que esperar mais uns anos para voltar a candidatar-se. A espera poderia ser longa, se tomarmos em conta a permanência de um mesmo presidente no poder em África. Uns 41 anos no Gabão, 39 na Líbia, 28 no Zimbabwe, 28 na Guiné Equatorial, 28 em Angola, 27 no Egipto, 26 nos Camarões. E por aí fora, perfazendo uma quinzena de presidentes que governam há mais de 20 anos consecutivos no continente. Mugabe terá 90 anos quando terminar o mandato para o qual se impôs acima do veredicto popular.

2. Se Obama fosse africano, o mais provável era que, sendo um candidato do partido da oposição, não teria espaço para fazer campanha. Far-Ihe-iam como, por exemplo, no Zimbabwe ou nos Camarões: seria agredido fisicamente, seria preso consecutivamente, ser-Ihe-ia retirado o passaporte. Os Bushs de África não toleram opositores, não toleram a democracia.

3. Se Obama fosse africano, não seria sequer elegível em grande parte dos países porque as elites no poder inventaram leis restritivas que fecham as portas da presidência a filhos de estrangeiros e a descendentes de imigrantes. O nacionalista zambiano Kenneth Kaunda está sendo questionado, no seu próprio país, como filho de malawianos.

Convenientemente "descobriram" que o homem que conduziu a Zâmbia à independência e governou por mais de 25 anos era, afinal, filho de malawianos e durante todo esse tempo tinha governado 'ilegalmente". Preso por alegadas intenções golpistas, o nosso Kenneth Kaunda (que dá nome a uma das mais nobres avenidas de Maputo) será interdito de fazer política e assim, o regime vigente, se verá livre de um opositor.

4. Sejamos claros: Obama é negro nos Estados Unidos. Em África ele é mulato. Se Obama fosse africano, veria a sua raça atirada contra o seu próprio rosto. Não que a cor da pele fosse importante para os povos que esperam ver nos seus líderes competência e trabalho sério. Mas as elites predadoras fariam campanha contra alguém que designariam por um "não autêntico africano". O mesmo irmão negro que hoje é saudado como novo Presidente americano seria vilipendiado em casa como sendo representante dos "outros", dos de outra raça, de outra bandeira (ou de nenhuma bandeira?).

5. Se ganhasse as eleições, Obama teria provavelmente que sentar-se à mesa de negociações e partilhar o poder com o derrotado, num processo negocial degradante que mostra que, em certos países africanos, o perdedor pode negociar aquilo que parece sagrado - a vontade do povo expressa nos votos. Nesta altura, estaria Barack Obama sentado numa mesa com um qualquer Bush em infinitas rondas negociais com mediadores africanos que nos ensinam que nos devemos contentar com as migalhas dos processos eleitorais que não correm a favor dos ditadores.

Inconclusivas conclusões
Fique claro: existem excepções neste quadro generalista. Sabemos todos de que excepções estamos falando e nós mesmos moçambicanos, fomos capazes de construir uma dessas condições à parte.

Fique igualmente claro: todos estes entraves a um Obama africano não seriam impostos pelo povo, mas pelos donos do poder, por elites que fazem da governação fonte de enriquecimento sem escrúpulos.

A verdade é que Obama não é africano. A verdade é que os africanos - as pessoas simples e os trabalhadores anónimos - festejaram com toda a alma a vitória americana de Obama. Mas não creio que os ditadores e corruptos de África tenham o direito de se fazerem convidados para esta festa.

Porque a alegria que milhões de africanos experimentaram no dia 5 de Novembro nascia de eles investirem em Obama exactamente o oposto daquilo que conheciam da sua experiência com os seus próprios dirigentes. Por muito que nos custe admitir, apenas uma minoria de estados africanos conhecem ou conheceram dirigentes preocupados com o bem público.

No mesmo dia em que Obama confirmava a condição de vencedor, os noticiários internacionais abarrotavam de notícias terríveis sobre África. No mesmo dia da vitória da maioria norte-americana, África continuava sendo derrotada por guerras, má gestão, ambição desmesurada de políticos gananciosos. Depois de terem morto a democracia, esses políticos estão matando a própria política. Resta a guerra, em alguns casos. Outros, a desistência e o cinismo.

Só há um modo verdadeiro de celebrar Obama nos países africanos: é lutar para que mais bandeiras de esperança possam nascer aqui, no nosso continente. É lutar para que Obamas africanos possam também vencer. E nós, africanos de todas as etnias e raças, vencermos com esses Obamas e celebrarmos em nossa casa aquilo que agora festejamos em casa alheia.

Mia Couto, moçambicano, é escritor

Fonte: congressonacionaldenegrasenegros@yahoogrupos.com.br em nome de José Roberto Militão, adv. (militaoj@terra.com.br)